Jussara Bianchi Castelli*
A amiloidose é uma doença rara, causada pelo depósito de proteínas insolúveis no nosso corpo. Diferente das demais proteínas biodegradáveis e recicláveis, que são a maioria, estas infiltram-se, depositam-se e destroem os órgãos. Atualmente são descritos 36 tipos de proteínas fibrilares que formam depósito amiloide, as quais geram pequenas fibras que se aglomeram numa estrutura física idêntica e insolúvel. Independente da situação clínica ou composição química, uma vez depositadas nosso organismo não consegue livrar-se delas.Conforme a doença produtora de proteínas que existe por trás da ocorrência deste depósito e a sua distribuição generalizada ou localizada, são definidos alguns tipos de amiloidose. Brevemente, falamos dos tipos mais freqüentes no quadro.
No coração, as proteínas mais comuns são a transtirretina (TTR) e as cadeias leves de imunoglobulina (AL). O diagnóstico de amiloidose cardíaca é difícil e em grande parte feito na necrópsia. A suspeita em vida é, em geral, o quadro de Insuficiência cardíaca de padrão restritivo.A biópsia de tecido, submetida à técnica chamada “vermelho Congo” ainda é o método para o diagnóstico da amiloidose. Mas ele não define o tipo de proteína depositada. O padrão ouro para definir qual a proteína depositada é a espectrometria de massas, que pode ser realizada no mesmo material da biópsia. Este método não está ainda disponível no país.
Confirmado o depósito amiloide nas biópsias (por exemplo, de miocárdico ou gordura abdominal), a identidade química protéica deve ser inequivocamente caracterizada para definir o tratamento. O objetivo deste trabalho foi desenvolver em nosso meio a técnica de identificação da proteína amiloide por espectrometria de massas (EM), por suas características de excelente desempenho: um único ensaio detecta muitos tipos de depósito amiloide, as variantes genéticas e os novos tipos de proteínas. Além disso, queríamos que a biópsia já realizada pudesse ser aproveitada, evitando outros procedimentos invasivos ao doente. Por este motivo, padronizamos o método de retirada do material de biópsia incluído em parafina, procedimento usual do médico patologista para possibilitar cortes dos tecidos e olhá-los ao microscópio.
Foram estudados os tecidos com amiloidose retirados da parafina de seis pacientes. A EM mostrou-se bastante específica na identificação da proteína que deu origem ao depósito amiloide, o que possibilitou a decisão correta quanto ao tratamento específico destes pacientes, sugerindo que esta técnica deva fazer parte da investigação laboratorial destes casos. Definir o tipo de proteína é fundamental para direcionar o tratamento adequado. Por exemplo, no caso da amiloidose AL pode ser necessário o transplante de medula óssea; já na amiloidose familiar (depósito de transtirretina), pode ser necessário o transplante hepático.
Alguns medicamentos novos (diflunisal e tafamidis) para a doença pela transtirretina, tem impedido que se formem mais fibrilas de depósito, “brecando” a doença e a destruição paulatina dos órgãos e tecidos. Outras linhas de medicamentos para silenciamento de genes estão em curso. Destacamos que muitos diagnósticos da amiloidose são feitos apenas na autópsia e que ainda não há remédio que remova o depósito. Esforços de pesquisa para identificação de biomarcadores que permitam o diagnóstico precoce da doença são prementes, assim como aqueles para remoção deste indesejável depósito proteico. Uma luta pelo diagnóstico precoce deve ser travada – conscientize-se!
|