* Stella Martins
O narguilé alcança status de epidemia moderna, sendo uma nova porta de entrada para o tabagismo entre os jovens. Na população masculina brasileira, entre 18 e 24 anos, o uso mais que dobrou no período de 2008 a 2013, passando de 2,3% para 5,5%, um aumento de 139%.
Estudo conduzido, nesse mesmo período, na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, revelou que mais de 40% dos alunos do 3º e 6º anos já haviam experimentado narguilé.
Entre os principais motivos para o aumento da experimentação estão o acesso fácil e o modismo para a socialização com amigos. Consta também o uso de aditivos, com uma infinidade de aromas e sabores, que aumentam a atratividade do tabaco do narguilé. E mais a falta de conhecimento dos danos à saúde associada à crença de que as substâncias tóxicas são filtradas e purificadas pela água, tornando o narguilé um produto menos maléfico à saúde.
No narguilé, as tragadas são mais frequentes, em maior número e duração, e com menor intervalo, gerando um volume total de fumaça inalado de 90 litros. No cigarro, em comparação, esse volume é de 350 mililitros.
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O tabaco do narguilé é composto de 30% de tabaco e 70% de mel ou melaço, umectantes e/ou inúmeros sabores de frutas.
Estudo que comparou uma sessão de narguilé com o uso de um único cigarro observou que as concentrações de nicotina, alcatrão e monóxido de carbono eram muito mais elevadas no narguilé (4,1 vs 1,8; 619 vs 24 e 192 vs 17 mg respectivamente). Numa sessão de narguilé, foram encontradas 82 substâncias tóxicas, além de 11 elementos classificados no Grupo 1 da Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (Iarc), como carcinogênicos para humanos.
O carvão chamado ecológico, derivado da casca do coco, é comercializado como “100% natural”, levando os jovens à crença de que é mais seguro ou até inócuo à saúde. Na realidade, esse tipo de carvão também está contaminado com hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAP), classificados no Grupo 1 da Iarc, para os quais não há nenhum nível seguro de exposição.
As essências herbais para uso no narguilé não possuem tabaco, portanto, não contêm nicotina, substância causadora de dependência. Entretanto, a ausência da nicotina não torna esse produto mais seguro. Estudo observou a presença dos cancerígenos como alcatrão, HAP, formaldeído e acetaldeído, além do monóxido de carbono e óxido nítrico.
Uma ou mais sessões por dia de narguilé podem desencadear doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Usuários de narguilé têm 339% mais chance de morte por câncer de pulmão se comparados aos não fumantes de narguilé. Além disso, compartilhar a mesma piteira durante as sessões de narguilé é risco para doenças infectocontagiosas, entre elas influenza, herpes labial e possivelmente tuberculose.
Diante do exposto, é possível afirmar que o uso do narguilé, com tabaco ou com herbais, eleva o risco para doenças cardiorrespiratórias, diversos tipos de cânceres e doenças infectocontagiosas.
*Médica Assistente da Divisão de Pneumologia.
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